segunda-feira, 28 de abril de 2008

Guerreiros da Metrópole

Texto publicado por este escriba há duas semanas no Blog O Pensador Selvagem:

Caros. Volto depois de um mês e tanto a este cada vez mais lido blog. A idéia é a de, nos dois próximos posts, publicar histórias de gente que, como eu, arrisca ou arriscou a vida se metendo, a bordo de uma bike, na guerra do trânsito de São Paulo. Gente que não dá bola para os buracos, para as buzinas, para a poluição e para a falta de interesse generalizada de governo e empresas em estimular o uso das bikes como meio de transporte numa cidade em que a frota de automóveis veículos vem aumentando na mesma proporção em que diminui a velocidade média dos carros – apenas em 2007, houve uma redução de 29 para 27 quilômetros por hora.


Ciente de que se trata de um problemaço, que poderá comprometer os planos de reeleição do prefeito Gilberto Kassab, a prefeitura lançou, em março, um pacote de medidas tímido, que deixou de lado grandes obras de transporte público (como a construção de novos corredores de ônibus) e soluções como o estímulo ao uso das bikes, por meio da construção de ciclovias.
Mas, indiferentes a planos e medidas e ao trânsito que se vai se avolumando nas ruas, diminuindo ainda mais a velocidade média dos veículos, os personagens que tentarei aqui descrever, verdadeiros guerreiros da metrópole, seguem pedalando pela cidade. Gente como o administrador de redes Denis Ferreira Lourenço.


Denis Ferreira Lourenço é um rapaz de classe média paulistano. Noivo, 29 anos, ele atua como administrador de redes numa empresa do grupo Neogrid - prestadora de serviços para companhias de telecomunicações. Mora num apartamento confortável no bairro de classe média da Barra Funda e freqüenta uma academia em Perdizes, a poucos quarteirões de casa. Denis não combina com o tipo geralmente associado às pessoas que costumam ir para o trabalho de bicicleta. Mesmo assim, quase que diariamente, percorre, a bordo de uma bike, os 11 quilômetros que separam o apartamento do trabalho.


Faz isso desde abril de 2005, quando, cansado de primeiro, esperar pelos ônibus e, depois, se espremer dentro deles, resolveu se arriscar a ir de bike. Nunca mais parou. Nem mesmo quando a companhia transferiu sua sede da avenida Faria Lima para a Vila Olímpia, quatro quilômetros mais distante.


Aliás, desde então, em vez sua motivação só aumentou; Denis já trocou de bicicleta três vezes. Pedala, atualmente, a bordo de uma moderna Gary Fisher com freios a disco, sapatilhas especiais, velocímetro e câmbio Shimano, modelo XT.


A poluição e o trânsito pesado não incomodam. "Faz parte de São Paulo", diz. Incomodo, mesmo, só quando chove. Nesses dias, Denis tem de deixar a bike na garagem e, por um dia, voltar a chacoalhar nos ônibus. Também não o incomoda o fato de a empresa não demonstrar, aparentemente, interesse em estimular o meio de transporte alternativo. Todos os dias, ele é obrigado a se espremer num minúsculo banheiro para tomar banho. "Mas é o que me basta". Também tem de acomodar a sofisticada bike num canto da garagem, junto com as motos.


Denis conta que, nesses três anos de ruas e avenidas congestionadas, nunca sofreu um acidente. Talvez por andar equipado com luvas, capacete e luzes sinalizadoras e por seguir à risca, as leis de trânsito. "No inicio, costumava invadir as calçadas para evitar ser atingido por algum veículo. Mas, quando li as leis de trânsito a respeito das bikes, descobri que essa prática é proibida. Desde então, passei a evitar. Mas, para além da questão da legislação, há outra, a do respeito aos pedestres. Quando se pedala na calçada, há o risco de as pessoas mais idosas se assustarem com a presença do ciclista e caírem, mesmo quando não são atingidas. Quem quer respeito tem de respeitar. Quando subo na calçada, desço da bike e me transformo, também, em pedestre".


Também nunca chegou a pôr na ponta do lápis o total que já economizou nesses anos com passagens de ônibus e gasolina. Para ele, na relação custo-benefício do uso da bicicleta o que pesa são, mesmo, a saúde e a liberdade. Afinal, trânsito e poluição são apenas trânsito e poluição. Faz parte de São Paulo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito corajoso esse Dênis! Apesar dos inegáveis benefícios à saúde de se ir trabalhar de bicicleta, se livrar da fúria assassina de taxistas, motoristas de ônibus intermunicipais de Guarulhos ou da Sambaíba (que atende a ZN de SP) ou simplesmente dos idiotas que cometem as maiores barbaridades no trânsito cientes da impunidade que existe nas ruas e avenidas paulistanas (a não ser que você cometa alguma infração facilmente arrecadatória, tipo excesso de velocidade ou furar rodízio) é uma tarefa herculea. Meus sinceros parabéns ao Sr. Denis! Na minha próxima encarnação, pretendo vir destemido como ele!