segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

No fim dá certo - Post de Natal, copiado descaradamente de Fernando Sabino

Três ponto um leitores deste mal-lido blog. Por falta de um lapso criativo que me inspirasse a escrever um texto alegre e bonitinho em homenagem ao natal, transcrevo aqui a crônica No Fim da Certo, do mestre Fernando Sabino. Afinal, se não deu certo é porque ainda não chegou ao fim. Mesmo que o ano tenha chegado ao fim. Hope you enjoy.

Ainda bem que já não se fala no malfadado livro A Lei de Murphy e Outros Motivos Por Que Tudo Dá Errado. É uma lei segundo a qual, por exemplo, seja qual for a fila em que você estiver, a outra andará mais rápido; todo arame cortado no tamanho indicado será curto demais; toda entrega de mercadoria que normalmente levaria um dia, levará cinco quando dependemos dela; todo telefonema importante vem no momento exato em (ou, pior, um minuto depois) que o interessado se sentou no vaso sanitário.

Quanto a esse exemplo escatológico da incidência da famigerada lei, no entanto, o telefone sem fio, podendo ser levado para o banheiro, representou uma forma segura de neutralizá-la.

De minha parte, poderia mencionar outras instâncias em que prevalece a Lei de Murphy, nos inconvenientes que somos forçados a enfrentar ao longo do dia - e principalmente da noite. Houve uma época em que eu acreditava seriamente haver o demônio designado um de seus menos categorizados capetas do inferno, verdadeiro fichina das maquinações diabólicas, para ficar aqui pela terra, mesmo incumbido da mesquinha missão de nos infernizar a vida em pequenos acidentes cotidianos: seria ele o inventor do famoso ferrinho de dentista. É quem nos faz pisar no cocô de cachorro, ser atingido por um perdigoto e ter de continuar a conversa como se nada houvesse acontecido, responder a um cumprimento dirigido a alguém atrás de nós, dar aquele ridículo pulinho no meio da rua ao ouvir uma buzinada nas costas, ou aquela patada no chão ao fim da escada pensando ainda haver um degrau, encontrar um fio de cabelo na sopa em jantar de cerimônia, despencar de cabeça no abismo das gafes imperdoáveis, enfim, expor-nos diariamente aos pequeninos tormentos diabólicos. Mas resolvi mandar o diabo ao diabo e desmoralizar seus enredos infernais.

Agora volta ele, encarnado nesse Murphy e sua lei abominável.

Pois me disponho a enfrentá-lo, lançando os fundamentos da Lei Anti Murphy, cujos corolários serão por mim oportunamente enunciados. Por ora me limito a colher inspiração em fonte mais judiciosa, qual seja a que emanava da sabedoria de meu pai, cujos oito baixos sempre respeitei. São os princípios otimistas da Lei de Seu Domingos que não me canso de enaltecer (como dizia meu pai, A Volta Por Cima), e que aqui enumero, devidamente resumidos:

1) As coisas são como são, e não como deveriam ser - e muito menos como gostaríamos que elas fossem.
2) O que não tem solução solucionado está - não adianta gastar boa vela com mau defunto.
3) Se quiser que alguma coisa mude, e não puder fazer nada, espere, que ela mudará por si.
4) Toda mudança é pra melhor: se mudou é porque não deu certo.
5) Mais vale passar por um apertinho agora do que por um apertão o resto da vida.
6) Antes de entrar, veja por onde vai sair.
7) Faça somente o que gosta. Para isso, passe a gostar do que faz.
8) Trate os outros como gostaria de ser tratado.
9) Não se deve aumentar a aflição dos aflitos.
10) A única forma de resolver um problema nosso é resolver primeiro o do outro.

Os dois últimos princípios decorrem daquela sábia observação de Carlos Drummond, no filme que fiz sobre ele, e que até parece inspirada por meu pai: não exigir das pessoas mais do que elas podem dar. Eu acrescentaria o que resolvi assumir a partir de hoje: todo mundo tem seu lado bom, ainda que pequenino; descobrir o de cada um com quem temos de conviver, e não sair dele.

Seu Domingos jamais se dexaria levar por esse Murphysmo nefando que se tenta impor em nossos dias. Sem saber, enunciava a fórmula capaz de exterminá-lo, quando dizia, de maneira categórica, ensinando-me a ter paciência:

- Meu filho, tudo nesse mundo no fim da certo. Se não deu, é porque ainda não chegou ao fim.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Fogos do tempo

Dona Marinez acordou sobressaltada, o coração palpitando sob o pijama branco de flanela. Ainda sonolenta, levou algum tempo para cair em si e entender que as seguidas explosões lá fora eram, não um tiroteio, mas os fogos do baile do Havaí, no clube da cidade, duas quadras adiante. Abriu a janela e ficou alí, os olhos passeando por entre as coloridas formas geométricas que se formavam, aqui e alí, nos céus da cidade.

Trinta e poucos anos haviam se passado desde que ela, ainda adolescente, entrara, pela primeira vez, naquela festa. Naqueles anos, em que televisão era coisa rara nas casas da cidade e em que TV em cores era um luxo a que só o seu Barbosa, da então movimentada rua Alberto de Barros podia se dar; em que geladeira era da marca Prosdócimo e o mundo era dividido entre a Arena e o MDB, a Jovem Guarda e a MPB, os engajados e os alienados – o Baile do Havaí era uma efeméride. Um acontecimento, como a própria ‘inauguração’ da TV em cores de seu Barbosa, alguns anos antes, na Copa de 1970.

Tão importante que era, o Baile do Havai não comportava distinções entre ‘tribos’ - palavra, aliás, que, naquele tempo, era usada só mesmo pra se referir às etnias indígenas. Alienados e engajados, ou, nos termos de hoje, mauricinhos e alternativos, marcavam presença ali, todos juntos. Bebiam soda e cuba libre, submetiam-se, logo na portaria do clube, ao ritual de pendurar no pescoço os famigerados colares de flores e voltavam pra casa cedo, não sem antes namorar no portão ou nos apertados fusquinhas, o carro popular da época.

Dona Marinez se lembrou, de repente, de quando o filho Adhemar, o mais velho, foi pela primeira vez ao baile. O ano era mil novecentos e oitenta e alguma coisa. Naquela noite, o baile foi interrompido pra que o vocalista do grupo que se apresentava anunciasse em primeira mão que Ayrton Senna acabara de conquistar o título mundial de Fórmula 1. O Adhemar, tão feliz que ficou, tomou algumas cervejas além da conta (tomar porre de Cuba Libre, a essas alturas, já era visto como excentricidade) e pulou na piscina do clube com roupa e tudo, os óculos dançando dois metros abaixo da superfície, como náufragos afogados naquela noite de delírio. Os anos passariam e Ayrton Senna conquistaria, ainda, mais dois títulos. Morreria em 1994, numa manhã chuvosa de domingo, enquanto o Adhemar quebrava a cabeça no vestibular prá faculdade de Direito.

Adalberto, o filho mais novo. Esse nem dera trabalho, lembrou dona Marinez. Foi ao baile do Havaí pela primeira vez aos 16 anos, já de mãos dadas com a Michelle, a namoradinha com quem se casaria oito anos depois. Não que não tivesse tirado, de dona Marinez, algumas boas noites de sono.

Andréa, a filha do meio, sempre se recusou a pôr os pés naquela festa. Baile do Havaí, sempre fora, para ela, uma festa da burguesia. Àquela altura, no final dos anos 1980, o termo 'tribo' já tinha a conotação que tem hoje, sendo usado pra denominar os diversos gostos estéticos, musicais, etílicos, etc. dos adolescentes. E as tribos já não se misturavam como na primeira vez que dona Marinez foi ao Baile do Havaí. Para Andréa, o baile era, mesmo, um motivo a mais pra encontrar os amigos e pôr a conversa em dia, entre uma garrafa e outra de vinho, em algum canto bem longe do clube.

Dona Marinez se perdeu naquelas lembranças todas enquanto assistia à queima de fogos. Entre a primeira noite em que enroscara no pescoço o famigerado colar de flores e aquele momento, foram trinta e poucos anos e um sem número de alegrias, expectativas, tensões e significados. Naquela noite, no entanto, os fogos eram apenas fogos.

(Texto dedicado a d. Eunice)

domingo, 9 de dezembro de 2007

A bikes do Oregon

Texto publicado no site O Pensador Selvagem, do qual me tornei, recentemente, colaborador.

Quem tiver interesse passe lá.

http://opensadorselvagem.org/pt/estilo-de-vida/bicicletas-na-cidade/cultura-e-business-em-duas-rodas.html

Dois ponto três novos leitores do blog O Pensador Selvagem. O conselho editorial (?) deste nobre espaço me convidou pra fazer parte de seu seleto time de escrevinhadores oficiais. Fui, como dizem na linguagem corporativa, 'brifado' pra tratar do tema "Bicicleta como meio de transporte". Pensei, pensei e resolvi aceitar. Confesso que tenho cá minhas dúvidas em relação à amplitude desse assunto. O uso da bicicleta como meio de transporte ainda é, na maior parte dos países, mais uma boa idéia do que uma medida prática, infelizmente. Por isso, aviso, desde já, que haverá, ao longo do período em que aqui estiver exercendo meu direito de dar pitacos, alguns desvios do tema central. Desvios, asseguro, para subtemas correlatos. E, pra não perder tempo demais com apresentações, posso dizer a meu respeito que escrevo com alguma freqüência num blog chamado Under Construction - http://doutroladodatela.blogspot.com/. Quem quiser me conhecer um pouco mais dê uma passada por lá.

Como trabalho neste post numa ensolarada e otimista manhã de domingo, começarei por uma historinha bacana. A cidade é Portland, capital do Estado do Oregon, no noroeste dos Estados Unidos. Considerada média pros padrões brasileiros (500 mil habitantes, mais ou menos), Portland é conhecida, nos 'isteitis' como a capital das bikes.

A cidade contabiliza, segundo o jornal New York Times, 32 quilômetros de ciclovias - São Paulo, vejam só, possui mais ou menos 11 milhões de habitantes, 22 vezes mais, e apenas 23 quilômetros. Possui, ainda, o maior porcentual de trabalhadores que utilizam a bicicleta para ir e voltar do trabalho, 3,5%. A, digamos, cultura ciclistica da capital do Oregon, se manifesta não apenas em números, mas também no dia-dia da cidade. Estacionamentos pra biciletas são comuns nas empresas da região.

Soa, para este escriba, bastante estranho que os Estados Unidos, logo eles, que inventaram a cultura do "cada um no seu carro" (que o mundo inteiro adotou, ressalte-se), que criaram a Ford e a GM, que batizaram Detroit como a capital do automóvel, abrigassem uma cidade como Portland, em que esse tão não-poluente meio de transporte tenha conquistado espaço.

O segredo, ao que me parece, é o fato de que, como em todas as áreas, os americanos transformaram as bikes num baita dum business. A cidade possui nada menos que 125 pequenas empresas que, de uma forma ou de outra, se beneficiam do negócio das biciletas, seja fabricando quadros, capacetes ou mesmo equipamento pra transporte das magrelas. O número de trabalhadores empregados nesse setor aumentou de cerca de 200 há uma década para mais ou menos 800 atualmente, informa uma consultoria especializada, a Alta Planning and Design.

As próprias autoridades da cidade já reconhecem o tremendo negócio em que as bikes se transformaram. "Nosso objetivo é tornar a cidade tão sustentável quanto possível. Isso significa sustentável socialmente, ambientalmente e economicamente. Não há retorno melhor para o investimento em transporte do que aquele destinado à promoção do uso das bicicletas", afirma o secretário municipal de transportes da cidade, Sam Adams. Na mesa do secretário, há um projeto para se ampliar a atual rede de ciclovias dos 32 quilômetros já mencionados para nada menos que 177 quilômetros.

Para os americanos, a questão, seja ela de que natureza for, só desperta interesse quando envolve uma boa oportunidade de negócios. E é assim, apostando nas bikes como business, que transformaram Portland numa cidade viável pros ciclistas.

Mais informações:

http://bikeportland.org/

Logo, logo, tem mais.

DV, jornalista, interiorano radicado em SP e tricolor até morrer, escreve sobre o que vem na cabeça em seu blog - Under Construction (http://doutroladodatela.blogspot.com/). No Pensador Selvagem, só sobre bikes e meio de transporte.

Samba, suor e autenticidade

Meus dois ponto três leitores. Os poucos de vocês que me conhecem sabem que, em termos de música, não sou lá dado a muitas concessões. Como a maioria dos adolescentes da minha geração - e de outras tantas -, passei por uma fase de paixão pelo rock'n roll e, feliz ou infelizmente, lá fiquei. Meu gosto musical, claro, evoluiu um pouco desde então, mas não foi muito além de algumas curtas incursões pelo jazz, o samba e a MPB - curtas, bem curtas. Pra não alongar demais a história, meu espectro não vai muito além de Beatles, U2, algumas bandas pop (não muito pop, tenho ojeriza de movimentos mais moderninhos, como o tal do Indie), João Bosco e Paulinho da Viola. Fato é que, goste ou não de samba, todo morador da 'capitar' que tenha um mínimo de interesse pelo que se pode chamar de cultura brasileira deveria, um dia, dar uma passada por um botecão chamado Você Vai Se Quiser, na Praça Roosevelt, centrão de Sampa.

Diferentemente dos charmosos, mas assépticos botecos da Vila Madalena, o Você Vai Se Quiser respira samba, suor e autenticidade.

Chegar ali não é pra qualquer um; o cidadão tem de ser iniciado pra encontrar esse gueto (literalmente) do samba. Fica no final de uma ruazinha estreita e sem saída, travessa da zoneada Rua Augusta. Os que ousarem entrar ali, numa tarde de sábado - quando são realizadas as rodas - não reconhecerão, de cara, que estão no caminho certo. É preciso andar uns 200 metros na ruela, em meio a mendigos e prédios em estado terminal de conservação pra chegar à casa.

O aventureiro que tenha conseguido chegar ao "Você Vai.." encontrará, alí, uma decoração das mais simples: piso de cimento queimado, iluminação clara, nem um pouco aconchegante, forro em gesso com desenhos geométricos, de extremo mau gosto e banheiros que nos horários de pico (por volta das 20h, quando a casa costuma receber sua lotação máxima, de 300 pessoas) se transformam em mórbidas sucursais do Rio Tietê - o mictório masculino é, na verdade, uma floreira em concreto. Nas paredes, há dezenas de fotos, quase todas em preto e branco, dos para os leigos, desconhecidos sambistas que por ali passam todo final de semana.

Essas características de simplicidade na decoração e no acabamento, direferentemente do que se poderia imaginar, dão ao "Você Vai...", um charme dificil de se copiar nos barzinhos da moda. Mas, à parte as discussões estético-arquitetônicas, o que chama mesmo a atenção são os já mencionados desconhecidos para os leigos sambistas que passam pela casa nas tardes de sábado. Mesmo aqueles que têm, no pé e no DNA, tanto samba quanto um turista dinamarquês - caso deste escriba - podem, ali, ter contato com o que, acredito, seja o verdadeiro samba de raiz, sem cordão de ouro no pescoço, sem gel nos cabelos e sem teclado nos arranjos. Passeiam ali, sozinhos, pelos sucessos de Cartola, Jamelão, Adoniran e outros tantos não-sei-quens do samba paulistano, o tamborim, o cavaquinho e o violão.

O ambiente, pra usar um clichê dos mais batidos, é democratico. Misturam-se patricinhas bem arrumadas, de saltos altíssimos e brincos enormes, garotões que, imagino, freqüentem cursos caros da FAAP, tiozinhos de cinqüenta, sessenta anos (encostados, no balcão, entre um copo americano e outro de cerveja - geladíssima, por sinal), manos equipados com óculos escuros espelhados, tatuagens enormes e tênis Nike do último modelo e divas do samba - negonas acima do peso e em roupas coloridíssimas, combinando com o batom vermelho nas bocas enormes.

E, por estranha que seja, essa mistura cultural funciona muito bem. Diferenças à parte, o importante é celebrar o samba.

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Vaso ruim não quebra

Meus dois ponto três leitores. Se alguém tem dúvida em relação ao futuro do Curintias, lhes digo: o timinho da Marginal não cai. Não porque não mereça, mas porque o Goiás, esse sim, tem demonstrado uma gana muito maior de conquistar sua vaguinha lá, na segundona. Longe deste escriba querer dar pitacos mais que intuitivos em relação ao esporte bretão - se é isso que vocês, dois ponto um leitores, querem, consultem o site dos colegas Cesarotti http://amalgama2.blogspot.com/ e Luizão http://mesadecalcada.blogspot.com, ambos bem fundamentados e consistentes no assunto. O site deles é de análise. O meu, apenas de palpites. O que me parece, entretanto, é que o Curintias não é, mesmo, pior que Goiás e Paraná. Talvez por isso tenham pipocado nos últimos dias entre os coleguinhas jornalistas funerais antecipados da gambazada. No fundo, no fundo, ninguém acredita, mesmo, que o Curintias seja rebaixado domingo. Por isso, todo mundo quer tirar sua casquinha enquanto é tempo.

Rest Test III

Dando seqüência à série de avaliação dos banheiros dos hotéis mais chichérrimos de SP, testei as dependências do Grand Hyatt, bem de frente prá fedorenta Marginal Pinheiros, em Sampa.

Outro banheiro abaixo das expectativas prá um hotel de altíssimo padrão, por isso, não recebeu mais que três privadinhas. O visual, no geral, não deixa a desejar. Piso de granito bem limpo, um espelho enorme na parede principal e um cheiro de citronela - além, claro, dos quadros abstratos, outro item, pelo que tenho visto, obrigatório na decoração, digamos, banheirística. Às cabines: ponto positivo pro papel higiênico, o único papel higiênico de verdade, de rolo, mesmo, que encontrei nesta cruzada sanitária. Ah, frescura máxima, as pontas dos papéis higiênicos estão sempre dobradas, imagino, pra passar a impressão de cuidado. Já a vedação, item sobre o qual este escriba discorreu no post anterior, deixa muito a desejar. Embora as cabines sejam fechadas, como no caso do Renaissance, há aquele enorme e tradicional vão - nesse caso, de uns trinta centímetros, mais ou menos - entre o piso e a porta. O suficiente pra um sacana de plantão dar aquela clássica espiada pela qual se tenta adivinhar, pelo modelo dos sapatos, o usuário da cabine. Ganchos na porta pra pendurar o paletó, há apenas um e, mais uma vez, repetindo os dois casos anteriores, falta uma prateleira pra mochilas e pastas. O Hyatt chegou, se não me engano, a ser um dos cotados para receber o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush no início do ano. Na mesma época, recebeu o presidente da Alemanha, Horst Köhler. Líderes mundiais respeitados e exigentes que são, é provável que Bush e Köhler não tenham, mesmo, utilizado os banheiros do Hyatt.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Rest Test II

Post iniciado na semana passada, de teste de banheiros de hotéis - área comun, repito; quartos, aos quais, evidentemente, este escriba não teve acesso, não foram avaliados. Ah, e, claro, foram banheiros masculinos, apenas. Aos resultados:


Renaissance (Alameda Santos) - Bom! Em quase todos os itens avaliados, obteve boa avaliação. A começar pela decoração, simples, mas de bom gosto. Compõem o visual alguns quadros abstratos e uma mesinha escura sobre a qual fica um vaso de orquídea, discreta e de bom gosto, como indicam as boas regras da decoração sanitária. É incrível, aliás, como as orquídeas são peça quase obrigatória na decoração dos banheiros de hotel. A cabine de evacuação, a parte que interessa, embora não receba a nota máxima (explicarei o porquê adiante) no geral é muito confortável. Bem vedada, impede que aromas e ruídos escapem para o ambiente externo, o que, como já foi dito em outro post, deporia contra a reputação do nobre cavalheiro. Já imaginaram se, por exemplo, um ministro - ou, pior, o próprio presidente Lula! - durante um evento tenha de ir a uma dessas cabines pra, digamos, se aliviar de uma indisposição intestinal-ministerial-presidencial? A caganeira do presidente vira assunto de boteco! Vedação de banheiro de hotel é, enfim, questão de segurança nacional e, como tal, deve ser tratada. E nesse quesito o Renaissance é nota dez, merece cinco privadinhas. Os ganchos instalados na parte de trás da porta também são de boa qualidade - dá pra pendurar dois paletós -, assim como os pisos e revestimentos das paredes, numa espécie de mármore escuro, com rejuntes bem alinhados. A dita cabine poderia receber nota máxima, não fossem dois detalhes: (1) o tamanho do papel higiênico - folhas de dez por quinze centímetros, uma dimensão, assim como no do Mofarrej, insuficiente pra manobras higienizadoras mais arriscadas; (2) a falta de uma prateleira pra acomodar pastas, mochilas, etc.
No geral, as cabines do hotelão da Alameda Santos são como um bom veículo sedã prêmium - poderia ser, por exemplo, um New Civic, um Vectra ou um Nissan Sentra, com câmbio automático, computador de bordo e uma série de outros ítens obrigatórios num carro de alto padrão. O slogan de um veículo dessa categoria, o Ford Fusion, serviria, aliás, pra definir os banheiros do Renaissance "Quem senta nesse trono fez por merecer". Não é, no entanto, o que se pode chamar de o melhor da categoria. Logo, logo, tem mais.

quarta-feira, 28 de novembro de 2007

Coisas que eu odeio

Pequena relação de situações que tornam meu dia-dia um pouco mais disgusting.

Freada de elevador

Leva de três a cinco segundos, cronometrados no relógio, dependendo, evidentemente, do modelo e da idade do equipamento em questão (sim, fiz questão de verificar) . Freada de elevador é, em poucas palavras, uma das sensações mais desagradáveis para portadores de síndrome pré-claustrofóbica, como este escrevinhador. Naquele tempinho quase imperceptível para os não iniciados nesse tão providencial meio de transporte, a sensação é a de pane geral, imediata e definitiva. Pior se, junto com você, compartilhando aquele espaço minúsculo, estiver, por exemplo, um chefe ou vizinho com o qual você não guarde grande afinidade. A convivência nos elevadores, por mais curta que seja, tem lá suas regras. Exige, em geral, que se olhe para baixo, num silêncio de funeral ou quando muito, que se atenha a assuntos banais, como a previsão do tempo, as condições do trânsito ou o último jogo do timão. Os prédios mais modernos, por sinal, são equipados com tecnologia de ponta a serviço dessas regras de boa conduta. Os elevadores, nesses edifícios high tech, possuem monitores de TV de última geração nos quais são veiculadas as notícias do momento - a respeito da previsão do tempo, das condições do trânsito e do último jogo do timão. De qualquer forma, mesmo para aqueles que não têm qualquer problema claustrofóbico, a perspectiva de um, digamos, apagão elevadorístico põe a perder todas essas regras, mudando completamente o panorama da partida. Sombrio.

Informações sobre as condições do Trânsito

Um serviço como esses deveria ser chamado de irritabilidade pública. O que me importa saber que a intransitável Marginal do Tietê está tão congestionada quanto a ultra-intransitável Radial Leste? As emissoras de rádio gastam, todos os dias, uma enorme quantidade de energia, dinheiro e combustível escalando repórteres, alugando helicópteros e tudo o mais apenas para lembrar aos pobres dos motoristas que não fará a menor diferença ir pro trabalho pela rua A ou pela avenida B, pois ambas estarão igualmente e inevitavelmente congestionadas. Num post anterior, comentei que, segundo o próprio prefeito Gilberto Kassab, há um déficit de 110 quilômetros de vias em São Paulo. Ou seja, ruas de menos prá carros demais. Comentei, também, que a solução seria estimular outros meios de transporte, mas esse não é o tema em questão. Voltando ao assunto: informações sobre condições de transito só servem, mesmo, pra lembrar que o trânsito da capital não tem mais solução. Melhor parar tudo e começar do zero.

Paulistano em cidadezinha do Interior

Meus zero vírgula três leitores paulistanos, me perdoem. Mas confesso que, como interiorano radicado nesta paulicéia que sou, nunca entendi lá muito bem por que raios os colegas aqui nascidos e criados têm a péssima mania de sair por aí exigindo, quando em terras menos urbanizadas, o mesmo padrão de atendimento da 'capitar'. Não, não quero aqui assumir o papel de defensor do descaso aos nobres direitos do consumidor. Também não sou fã de demora nos restaurantes, de cheiro de mofo em quartos de hotel ou de bife sangrando no lugar daquele filé ao ponto que o cidadão havia pedido. Mas, pior que esses deslizes, são os pequenos espetáculos proporcionados pelo dito povo civilizado de Sampa. Dos garçons ao cachorro, todos são alvo deste superexigente consumidor quando alguma coisa não sai como sairia nos restaurantes do Itaim, nos bares da Vila Madá ou em algum hotel bacana da Alameda Santos. "Moço. A pizza que eu pedi demorou 40 minutos. 40 minutos! O senhor tem idéia do que é isso? Pode suspender!"

Computador com síndrome de técnico

Quem nunca passou por isso? Acompanhe a seqüência:

01) O sujeito acaba de produzir um trabalho super esmerado num Photoshop da vida ou uma planilha complicadíssima no Excel, mas, na hora de salvar, TUM! Surge um retângulo enorme na tela acompanhado de um aviso do tipo "Não foi possível realizar esta operação";

02) Claro, numa situação como essas, qualquer cidadão com um mínimo de experiência em peripaques tecnológico-corporativos (ou, em tecniquês, 'paus') sabe que, na maioria das empresas há um departamento responsável quase que somente por resolver esse tipo de problema - em geral esses departamentos são conhecidos mais por siglas que por nomes; pode ser Centro de Processamento de Dados (CPD), Central de TI (TI, mesmo) ou algo que o valha.

03) Os técnicos desses departamentos, em geral castigados pela falta de intimidade com os PCs (mal que atinge predominantemente a geração-máquina-de-escrever), vivem atolados de trabalho. Por isso, demoram preciosos minutos pra chegar no ponto em que se encontra o infeliz do Photoshop;

04) Quando isso finalmente acontece, a invariável primeira pergunta do técnico: "O que tá acontecendo. Pode me mostrar?" (E incrível a capacidade que esses caras têm de manter a mesma cara de paisagem, mesmo que o caso em questão seja de perda total da HD e o desesperado, o próprio presidente da empresa);

05) O desesperado que havia ligado há quarenta minutos - e que durante esse tempo todo, não havia feito mais nada, a não ser amaldiçoar gerações e gerações da família do pobre técnico, repete o procedimento;

06) A máquina, por pura sacanagem, realiza a operação normalmente. O arquivo é salvo, o e-mail é enviado, o comando solicitado aparece, tudo rapidamente e sem o menor transtorno. Como a vingança, dizem, é um prato que se come frio, o técnico, diante do constrangimento do colega - dado o inesperado ataque de eficiência da máquina -, sequer lhe dirige uma palavra. Lança-lhe, em vez disso, apenas um olhar de desprezo.

Telemarketing

Preciso tá explicando?

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Às compras de Natal

O jornal americano New York Times publicou, no último domingo uma matéria de comportamento a respeito de compras de fim de ano. Começa assim: "Pra muita gente a verdadeira diversão das festas de fim de ano vem das compras, como ir a uma loja às 4h (da manhã!) para obter melhores ofertas ou encontrar aquele brinquedo impossível de se encontrar nas promoções de Natal."

Segundo a matéria, o prazer que uma pessoa proporciona a si mesma realizando boas compras - leia-se obtendo bons preços ou encontrando os produtos que nesta época do ano costumam sumir dos balcões ou prateleiras, dada a enorme demanda - é algo que beira a excitação provocada por determinadas drogas, lícitas ou ilícitas.

No país que possui o maior PIB do Planeta e, salvo enagano, os consumidores mais vorazes, a questão já é até mesmo tema de estudos acadêmicos. Uma dessas pesquisas - a apresentada no NY Times - é a do psiquiatra Donald Black, da Universidade de Iowa.

Segundo o professor Black, o mecanismo dos compradores é parecido com o que move os viciados em jogos de azar, por exemplo - o que ocorre, simplificadamente, é a liberação, no cérebro, de substâncias químicas ligadas à euforia toda vez que o jogador aposta ou que o nosso ávido consumidor sai por aí torrando o dinheiro em ofertas imperdíveis.

O psiquiatra publicou seus estudos no jornal da Associação Mundial dos Psiquiataras, sob o título Um estudo do Distúrbio das Compras Compulsivas (CDB). Sim, a enfermidade já ganhou até nome oficial! Não surpreenderia se daqui uns anos, ganhasse as ruas e caísse na boca do povão, como, por sinal, já aconteceu com tantas outras denominações médico-psicológicas, como o Transtorno Obsessivo Compulsivo ou hoje em dia, pra qualquer Joãozinho, TOC - ou com uma dezena de outras disfunções ligadas à questão sexual ou à obesidade, por exemplo. Já imaginou? Sua namorada chama as amigas pra ir à Zé Paulino pra umas comprinhas e, na hora, já ouve das coleguinhas "Meninas, você pode tá com CBD. Eu, mesma, fiz anos de terapia. Na semana passada, eu fui na Vinte e Cinco e gastei só trezentos e vinte reais!"

Segundo o estudo, entre os americanos, o índice de, digamos, contágio, desse distúrbio é de pouco menos de 6%. Pra quem quiser saber mais, o endereço da pesquisa é http://www.indiana.edu/~engs/hints/shop.html. Mas atenção: mesmo para aqueles um vírgula dois leitores que dominarem o vocabulário anglófono e se sentirem meio culpados na hora de passar o cartão de crédito numa daquelas maquinetas, advirto que o nobre acadêmico se recusa terminantemente a responder perguntas a respeito da questão ou prestar qualquer tipo de consultoria a potenciais portadores de CBD, sejam eles brazucas ou mesmo americanos. Logo de cara, na entrada do site, um enorme banner avisa: "Não poderei mais responder questões a respeito de vício em compras devido ao enorme número de acessos a este site." Os números do professor, os tais 6% só podem estar, mesmo substimados. Nos Estados Unidos e aqui mais pro Sul.

As inúmeras maneiras de se matar um inseto (texto do Cleido)


Se o texto é bom, nóis publica. O artigo abaixo é de um cara chamado Cleido - um amigo da família do qual este escriba não sabe sequer o nome. Sabe, apenas, que vive na gloriosa Ribeirão Preto e que é amigo da família. E só. Mas, pra deleite de vocês, dois vírgula um leitores, segue aqui reproduzido.


Só existe um animal que eu mato conscientemente e com prazer, os pernilongos. O resto tento evitar, quando possível. Lógico que uma barata, frente a frente comigo, no meio do meu lar, terá uma morte rápida, certa, digna e com pouco sofrimento. Mas, nesse caso, sou eu ou ela. Isso também é válido para aranhas. Só mato em caso de extrema necessidade.

No passado fui mais sádico. Na infância, fazia uma mistura de água e terra e colocava as saúvas para afundarem igual às areias movediças dos filmes de selva e mistério. Na adolescência e também quando era um jovem adulto, tinha um prazer quase sensual de afogar formiguinhas em pias de cozinhas e banheiros. Vinha, igual a um deus-inca-tsunami e mandava todas para o ralo. Sempre deixava algum sobrevivente para que ele pudesse contar para o resto do formigueiro sobre o terrível deus Tsu.

Pelo menos, os quatro anos de psicoterapia serviram para superar essa fase de destruição sádica de himenópteros associado ao delírio do uso indiscriminado de meu poder divino. Na verdade, ainda acho que tenho esse poder, porém, a psicanálise me mostrou que não devo usá-lo contra as pobres e indefesas formigas. Hoje, gasto parte do meu tempo-para-gastar-com-coisas-que servem-para-alguma-coisa aperfeiçoando técnicas para exterminar os famigerados pernilongos. Eu, particularmente, gosto de matar aqueles que passaram a noite chupando o meu sangue ou o de algum familiar e estão lá, gordos, lentos, como nós ficamos após uma feijoada e três pedaços de torta de mousse de limão num domingo quente de verão. Gosto de projetar a trajetória do vôo lerdo deles, usar meu cerebelo para calcular onde eles vão estar no instante seguinte e plaft!

Depois é só lavar a mão com sabonete.

Com o tempo, fui me especializando. Posso ficar parado esperando o besta se aproximar e vupt, catá-lo com a mão em um movimento rápido derivado dos antigos filmes de kung-fu. Se ele está pousado em alguma parede, o ideal é bater as palmas das mãos sobre ele que, sai voando no primeiro deslocamento de ar e morre prensado entre os dedos. Chega a ser triste vê-los cairem nesse golpe sujo das mãos.

Os Aedes aegypti são um caso a parte, voam ligeiros e fazem curvas aéreas irregulares que tornam difíceis as previsões cerebelares. Eles nunca estão onde você pensa que eles estarão no momento seguinte. Também possuem uma personalidade insistente, possuem uma auto-estima elevadíssima, têm certeza que vão conseguir chupar seu sangue e não desistem facilmente. Atacam enlouquecidamente à luz do dia e, acho, já lutaram no Vietnã e na guerra da Coréia. Eu diria que a morte de um tigradinho pode valer muitos pontos no campeonato nacional de caça aos seis patas. E nem vou entrar no mérito da questão epidêmica causada pelos capetinhas. Às vezes, sou atormentado por dúvidas existenciais. Matar ou não matar seres vivos? Ter prazer em tudo isso, faz de mim um ser menor? Comer uma alface é destruir uma vida? Devo continuar desvirando besouros, que estão de barriga para cima e mexendo as patinhas, quando os encontro pelos caminhos que a vida formou, após um chuva quente de verão?

Sinceramente, não sei a(s) resposta(s) para tudo isso. Sei apenas que existem momentos, em que entendo a complexidade da teia da vida, das gotinhas de orvalho, do equilibrio dinâmico das redes do acaso. Nessas horas, chego a lamentar o prazer que sinto ao subtrair desse universo mais um pequeno inseto sugador de sangue. Olho para as vaquinhas ruminando no campo e penso em um mundo melhor. Penso no pão light, nas verduras, na leveza do corpo filtrado de LDL, no coexistir sustentável com os outros seres vivos que ainda sobrevivem nesse planeta sem muito futuro. Mas, noutras predominantes e perigosas horas, o que me move é o banho de serotonina que meu cérebro recebe quando esmago uma pernilonga gordinha de sangue ou quando caio de boca na misturinha de carne + rodela de bacon do Macnífico, acompanhado das salgadas, ao excesso, batatas fritas e de uma coca-cola gelada até o inferno.

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Rest Test - Ou, nas melhores casinhas do ramo

Meus dois ponto três leitores. Este é um daqueles posts em que o título puxa a idéia do texto. Quem já trabalhou numa redação de jornal sabe que, em geral, o texto é escrito primeiro. O título, por mais criativo e engraçadinho que seja, vem depois. Esta habilidade, a de criar bons títulos, anda, aliás, em falta nos nossos jornais. Não se vêem mais em nossos periódicos os títulos criativos que fizeram a fama e o bom - ou nem tão bom - nome de publicações como o Jornal da Tarde (JT) e o falecido Notícias Populares. De qualquer forma, este é um assunto pra outra hora, se é que haverá um lapso criativo deste escriba voltado a tal finalidade.

A linha que dá nome a este post não é, por sinal, sequer criativa. Mas vale uma explicação prá idéia totalmente idiota que me ocorreu a partir deste título. Rest vem do inglês restroom, que significa banheiro - não o banheiro completo, no modelo que temos em casa, com chuveiro e pia (que, no vernáculo anglófono, seria traduzido como bathroom - algo como cômodo do banho), mas o compacto, equipado apenas com uma essencial e providencial latrina. Pra ficar mais claro, um teste de banheiros de hotéis - os banheiros localizados nas áreas comuns, e não os dos quartos, que na maioria das vezes possuem hidromassagem, dezenas de espelhos, etc. O post será atualizado na medida em que tiver acesso aos locais de testes. Serão três ou quatro posts, na ordem.

Gran Meliá Mofarrej - Numa palavra, decepcionante. O que esperar dos sanitários
um hotel bacana da região da avenida Paulista? Hotel, aliás, em que já se hospedaram figurões como os canadenses do super trio Rush? Nada, infelizmente.

Aos fatos:

(1) as divisórias que separam as, digamos assim, 'cabines de evacuação' são relativamente baixas, um metro e oitenta, mais ou menos, com um considerável espaço até o forro, cerca de meio metro pra cima. Numa situação como essas, claro, qualquer cavalheiro que ouse ocupar e utilizar esses espaços padecerá de um enorme constrangimento, tendo de compartilhar com os demais seus próprios ruídos - e, claro, aromas.

(2) papel sanitário - outro item sofrível. Pelo formato e pelo tamanho, lembra muito um guardanapo, de dez por dez centímetros. Reconheça-se, a qualidade do material é excelente, super, como diz a propaganda do enxaguante bucal Oral B, sem álcool, "gentil com a sua boca" (nesse caso, não com a boca....). O tamanho, no entanto, é muito pouco adequado a qualquer tipo de manobra que seja necessária numa situação de emergência - ou num caso em que o usuário tenha algum tipo de deficiência motora. Pior: o equipamento no qual é acondicionado o papel - e que teria como função única permitir que seja retirado do tal equipamento uma folha por vez, para que não haja desperdício - só serve, mesmo, pra rasgar os já insignificantes papéis sanitários. Eles têm de ser retirados por um minúsculo orifício na parte inferior do mecanismo, o que implica em inevitáveis rasgos. Nessas condições, nem pra assoar nariz acabam servindo.

(3) Faltam prateleiras. Num local como esses, nas área de eventos dos hotéis, os banheiros costumam contar com providenciais prateleiras nas já mencionadas cabines. Claro, como esses hotéis atendem dezenas de eventos todas as semanas, os participantes, em geral, já entram ali com pastas (nas quais vai o material promocional), bloquinhos de anotações, mochilas, etc. Resta, ao desavisado cavalheiro, deixar seus pertences na pia (na área comum do banheiro) ou esquecer qualquer tipo de preconceito contra atitudes menos dignas de um cavalheiro e pôr tudo no chão, mesmo. Ponto positivo (um dos poucos) pro ganchinho fixado na porta, excelente pra pendurar paletós e casacos. Poder abrir mão dessas peças de roupa mais pesadas num momento como esses, de reflexão, deveria ser, afinal, um direito básico de qualquer cidadão.

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

UNDER CONSTRUCTION DE CARA NOVA!!!!

Meus dois ponto três leitores. Por absoluta falta do que fazer, neste modorrento - adoro esta palavra, 'modorrento' - feriadão, resolvi dar a este inútil espaço uma cara nova.

Na ausência de capacidade para lidar com os Corew Draws e Photoshops da vida, só me restou recorrer a um modelo pré-fabricado, oferecido pelo próprio site. A cara, como vocês podem notar, é de carteira de identidade - por isso, arrisquei pôr um retrato de minha pessoa, aqui do lado pra completar o figurino.

A foto, acreditem, não configura qualquer tipo de indicativo de convicção política - o burro, pra quem não sabe, é, nos EUA, o símbolo do Partido Democrata, dos ex-presidentes Bill Clinton, Jimmy Carter e John Kennedy, embora combine mais com o atual, Jorginho Bush. Hope you enjoy.

sábado, 10 de novembro de 2007

Tricolores inesquecíveis

Meus dois ponto três leitores. Me perdoem se volto ao tema futebol. Me perdoem, também, se copio descaradamente uma idéia do nobre ex-colega Fernando Cesarotti, jornalista esportivo, blogueiro bem sucedido (http://amalgama2.blogspot.com/) e grande entendedor do assunto que predomina nos botecos, casas de sinuca e ambientes freqüentados por marmanjos em geral.

Pois bem, a idéia não muito nova - na verdade, bem velha - do Cesarotti foi publicar a lista dos 30 jogadores que marcaram seus 30 anos. Eu, do alto dos meus 33, não ousarei relacionar minha seleção com qualquer tipo de efeméride. Também não me passa pela cabeça pôr lado a lado, nossas duas listas. A minha, tenho certeza, seria uma vergonhosa e passional relação de são paulinos que, de uma forma ou de outra, tiveram participação decisiva nos títulos do tricolor. A dele, uma criteriosa seleção técnica de craques cheios de qualidades invisíveis a olhos leigos, como os deste futebolisticamente iletrado escrevinhador. De qualquer forma, fica a homenagem aos caras a quem devo efêmeras alegrias nas tardes de domingo:

1) Raí - Não tem pra ninguém, mesmo. A lista poderia ser mais óbvia se tivesse o óbvio Rogério Ceni no topo. Mas creio que nenhum jogador tenha sido tão importante pro SP em finais. Rai tinha, talvez, como maior qualidade a de se sair especialmente bem contra o Corinthians. E em finais. Foi assim em 1991, quando marcou três gols na primeira partida da decisão e, depois, em 1998, quando jogou apenas uma partida, a final. E bastou. Da mesma forma que os corinthianos idolatram o irmão mais velho, o igualmente craque Sócrates, que tantas vezes massacrou o tricolor, qualquer são paulino que se preze tem pelo Rai um respeito que beira a veneração. À parte as deliciosas e destruidoras performances contra o Corinthians, o mais importante, mesmo, foi a atuação decisiva na partida contra o Barcelona, em 1991, na primeira vez que o tricolor conquistou o mundial. A grande diferença do Rai em relação aos demais jogadores que compõem esta lista - e grande motivo pra ele ocupar o topo - talvez seja o fato de que diferentemente dos demais, até mesmo do RC, a lista de imagens inesquecíveis por ele protagonizadas é imensa. Pincei, das que tenho, duas particularmente emocionantes: (1) o primeiro gol contra o Corinthians na primeira partida da final de 1991 (SP 3 X 0 Corinthians), um chutasso do meio de campo. Seria o início da vingança pelo Brasileiro que havíamos perdido em 1990 - tá bem, Paulista contra Brasileiro, os corinthianos levam a melhor, mas foi, a seu modo, um troco; (2) a imagem de o Rai correndo, determinado, em direção ao eterno Telê Santana após ter marcado o gol de barriga na final contra o Barcelona. Certamente uma das imagens mais inesquecíveis da história do SP. Rai merecia. Telê merecia.

2) Rogério Ceni - Rogério é, talvez, o maior ídolo da história do SP. Surgiu do nada, como uma sombra do incontestável Zetti, como o candidato natural ao posto de primeiro homem do tricolor, historicamente uma espécie de coadjuvante de sucesso - papel cumprido, antes, com perfeição pelo proprio Zetti e por outros antecessores, como Valdir Peres, Gilmar Rinaldi e Poy. Mas Rogério foi além. Transformou esse posto em papel principal - e aí está seu maior mérito. Na base desse novo papel está, claro, o excepcional talento pra cobrar faltas (77 gols até hoje, segundo seu site http://www.rogerioceni.com.br/home/, um recorde mundial). Mas há outras características que fazem dele um mito: performances igualmente excepcionais debaixo das traves - tá bem, no auge, em 1999, Marcos, do Palmeiras, foi melhor - e uma fidelidade ao clube rara em qualquer equipe nos dias de hoje. Tudo bem, nesse ponto está a única mancha em sua carreira, uma mal-sucedida tentativa de transferência pro Arsenal (clube inglês), em 2001. Mas isso não chega a arranhar sua imagem de comprometimento com o tricolor. Prova disso é o fato de ser recordista de jogos com pelo SP, 770. Reconhecido como ídolo há uma década, mais ou menos, faltavam-lhe, diziam os críticos, títulos de expressão. E ele vieram a partir de 2005. A imagem inesquecível (e incrível) é a de Rogério erguendo a taça da Libertadores. O auge da carreira de um craque.

3) Serginho Chulapa - Tá bem, já sei. Se algum são paulino mais fanático um dia acessar este blog - o que seria o meu segundo leitor, e, portanto, coisa quase impossível de acontecer...-, dirá que o Serginho fez carreira no Santos e lá se consagrou - em conseqüência do gol que fez na final do Paulista, em 1984 e do fato de integrar até hoje a comissão técnica do Peixe. Mas, pra mim, o Serginho tem um significado especial. É dele a primeira lembrança que tenho de um jogador do São Paulo, em 1981, um inesquecível chapéu no goleiro Carlos (que, logo depois, iria para o Corinthians), num gol que garantiria o título. Me informa o site tricolormania (http://www.tricolormania.com.br/) que o Chulapa foi o jogador que mais fez gols pelo São Paulo, 242. Mas a leviandade das estatísticas (os idiotas da objetividade, como diria o tão ignorante futebolisticamente quanto eu Nelson Rodrigues) não considera os setecentos e setenta e nove gols e as performances inesquecíveis deste craque em minhas equipes de futebol de botão. Devo provavelmente ao Chulapa o fato de ser são paulino. Por isso, e pelo recorde de gols, vai pro terceiro lugar.

4) Mineiro - Fez o gol do título em 2005. E um gol decisivo contra o Goiás, em 2006, faltando quatro rodadas pro final, que praticamente consolidou o tetra-campeonato brasileiro. Compôs, com o igualmente excelente Josué, uma das melhores duplas de volantes que o tricolor já teve. Só por isso, já merece um lugar na minha lista. Quietão, se enquadra bem naquele perfil de jogador carregador de piano indispensável nos grandes esquadrões.

5) Zetti - Armelino Donizetti Quagliato. Eita nome estranho pra um jogador de futebol -ou, melhor dizendo, para um goleiro. Não fosse o surgimento do discípulo Rogério Ceni, Zetti ocuparia o primeiro lugar na lista dos meus goleiros inesquecíveis. Foi um dos comandantes, talvez o mais importante jogador naquela campanha da conquista da Libertadores em 1992. A imagem inesquecível do Zetti, pra mim, é a dele se preparando pra defender o penalti que daria aquele título ao São Paulo. O cobrador, o argentino Gamboa, principal atacante do adversário, o Newell´s Old Boys, transpirava confiança. Mas Zetti, tranquilo, defendeu. Depois daquela defesa, o tricolor nunca mais encararia a Libertadores da mesma maneira.

6) Muller - Brilhou em dois momentos diferentes. Primeiro, no time dos 'Menudos' do inesquecível Cilinho, em 1985 - um dos primeiros títulos dos quais me lembro com clareza, do alto de meus, na época, 10 anos. Nessa mesma época, diga-se, foi destaque jogando como centroavante (substituindo Chulapa, aliás) em minhas imbatíveis equipes de futebol de botão. Mas a consagração veio, mesmo, em 1993, contra o Milan, no segundo título mundial do tricolor, quando, por um desses caprichos do futebol, a bola resvalou em seu calcanhar - sim, resvalou, a jogada não foi intencional, pelo que me lembre - e entrou. À parte a vitoriosa carreira no SP, teve, também, bons momentos no paparicadíssimo Palmeiras de 1996. Uma das imagens inesquecíveis é a de Muller apontando pro zagueiro Costacurta, do Milan, após o gol, aparentemente desabafando num momento em que o tricolor praticamente garantia o título diante de um adversário teoricamente mais poderoso - imagem, aliás, precariamente reproduzida na foto ao lado. Um daqueles momentos em que a sorte recompensa o talento.

Amanhã tem mais.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

Mancha corporativa

Pequena insusão pelo mundo da ficção. A mancha é baseada em fatos reais. Os outros fatos não possuem conexão com a realidade. Pelo menos com a minha. Hope you, one point seven readers, enjoy the experience...

Ela estava alí, enorme. Tão apavorado que ficou, Reginaldo nem se deu ao trabalho de tentar descobrir se ela foi aparecendo aos poucos, sem que ele se desse conta, ou se tinha simplesmente brotado alí de repente, como uma daquelas ilhotas que volta e meia surgem do nada no meio do pacífico Pacífico, quando um vulcão entra em erupção nas profundezas.

O fato é que ela estava lá. Intrépida. Impávida. Impassível. Desprezíveis nove milímetros de diâmetro, uma insignificância. Mas naquele ponto, no alto do penhasco onde as maçãs do rosto fazem uma curva em direção à cavidade ocular, a mancha vermelho escura estava numa localização privilegiada o suficiente pra causar uma enorme dose de preocupação.

E justamente naquela manhã prá qual estava marcada a temida reunião mensal de diretoria. Sim, temida. Afinal, reunião de diretoria não era uma reunião qualquer. Era dia de jogo decisivo. Era ali que os manda-chuvas decidiam o futuro de nobres e plebeus, tomavam as decisões de vida e de morte. Isso era lá dia prá desgraçada da mancha aparecer? E logo daquele tamanho, com colossais nove milímetros de diâmetro?

O pobre do Reginaldo, meio atônito, suava diante do espelho. Pensava nos meses que havia empenhando estudando cada detalhe da concorrência, levantando os pontos fortes, as áreas de atuação, visitando pontos de venda. Varara noites elaborando relatórios. Descobrira que a principal concorrente estava à beira da falência. E a reunião de diretoria seria o momento exato pra revelar essa situação. Os diretores, boquiabertos, se impressionariam. Perguntariam. Seria a consagração. O jogo do título, com o estádio lotado, a torcida a favor e o adversário fragilizado. E a maldita mancha estava lá, pra estragar aquele momento.

Num instante, os pensamentos voltaram ao banheiro do apartamento. Passaram, então, a passear por comerciais de TV. Reginaldo revirava a cabeça tentando relacionar todas as propagandas de produtos anti-manchas de que se lembrava. "Caiu, bateu, coçou? Tem de ser coçol!"... "Passa Vodol que passa!"... "Novo Vanish Poder O2. Tira mancha sem estragar as suas roupas..." Bah! Aquilo não era hora pra devaneios.

Não havia tempo a perder, o momento era de decisões drásticas. Meteu no rosto uns óculos escuros enormes e pulou pra dentro do elevador, ainda com a gravata nas mãos. Num instante, estaria na empresa, sentando-se na ponta oposta à do chefe, na enorme mesa de madeira clara em torno da qual perfilavam-se todos os demais diretores.

Os nove milímetros de diâmetro da mancha, felizmente, eram pequenos o suficiente pra que o Reginaldo alternasse quase uma dezena de gestos intelectualóides - lembrara-se da 'cara de conteúdo, o mote de uma velha campanha de propagandas do Estadão - que, de alguma maneira, disfarçavam a catástrofe. Tomado pela pavor, ficou alí, esforçando-se pra demonstrar interesse nas longas exposições dos colegas. Saiu calado. O relatório teria de ficar prá próxima, fosse quando fosse.

Desanimado pela performance pífia, levantou se, a mão esquerda espalmada sobre o lado esquerdo do rosto, o da mancha, num gesto que combinava bem com aquele momento de fiasco. Mário Henrique, o diretor financeiro, que pouco se manifestara durante a reunião, chamou-lhe com um gesto, como se quisesse lhe confidenciar algo. "Rapaz, notou como o chefe tá quietão? Pois tudo o que disseram aqui hoje não vale nada, mermão. Nadinha. Ontem à noite a PF baixou aqui e descobriu uma porrada de documento sujo na contabilidade. Levaram tudo prá sede. Só não divulgaram ainda porque não conseguiram uma prova mais firme. Se essa história estourar, todo mundo vai ficar marcado. Isso aqui vai virar um caldeirão..." As mãos, aquela altura, vagavam incertas, ora remechendo os cabelos, descrevendo, com os dedos, pequenos, cachos, ora metendo-se nos bolsos, a procura de um objeto qualquer. Baixara a guarda. Afinal, o que era a tal da mancha?

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Consumidor tricolor

Meus dois vírgula setenta e cinco leitores. Dizem por aí que torcer pro tircolor é uma grande moleza. Que o São Paulo é o time mais organizado do futebol brasilero. E mais rico, mais bem administrado, etc.

Pois bem: creio que, passada a previsível enxurrada tardia de elogios cabe às mentes mais esclarecidas pôr às claras que o tricolor não faz mais do que seu dever. Digo, não faz mais que sua obrigação em entregar a nós, torcedores, o que nos é devido, como clientela que somos. Afinal, nesses dias, em que tanto se fala em respeito aos direitos do consumidor, foco no cliente, relações customizadas, e tudo o mais, nada mais justo exigirmos nossos direitos.

Os mais exigentes irão logo pensar que trato de pequenezas como compra de ingressos pela Internet, amplos e seguros estacionamentos, longe do território dos cambistas, cadeiras numeradas nos estádios, banheiros limpos e outras irrelevâncias. Bobagem. Perfumaria. Peaunuts!

Trato, mesmo, de um produto mais nobre, de um objeto de desejo - e que, por isso mesmo, tem de ser entregue com qualidade, pontualidade e respeito à clientela: gols, títulos, ídolos.

E como o tricolor tem atendido bem às expectativas de seus consumidores? Simples. Tá no Código de Defesa do Defesa do Consumidor, Lei 8078/90 (http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L8078.htm, pra quem quiser pesquisar).

Por exemplo:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

I - a proteção (...), da saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

Vejam só: o código fala em 'saúde'. E o que o tricolor faz senão proteger nossa saúde contra o stress do dia-dia nos dando, a cada jogo, um motivo para esquecermos do chefe mal humorado, do congestionamento na marginal, do vizinho do apartamento ao lado que ouve É o Tcham no volume máximo, da namorada que tem sempre, às dez da noite, aquela providencial dor de cabeça? Isso sem falar na tranquilidade que nos proporciona evitando ataques de nervos que poderiam ser causados por provocações de adversários engraçadinhos.

Mais: o código fala em proteção contra os 'riscos provocados por (...) serviços perigosos ou nocivos'. Torcer pro tricolor nos protege dos riscos provocados pelos demais prestadores de serviços do futebol - estes, sim, perigosos e nocivos.

II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações. Já ouviram falar num projeto chamado Batismo Tricolor? Trata-se de uma 'cerimonia' pela qual qualquer pessoa pode ser tornar oficialmente são paulina, com reconhecimento de certificado e tudo -
http://www.saopaulofc.net/batismo/index.html . O que é o batismo senão um processo pelo qual se informa a clientela das qualidades do produto e de sua conformidade com os desejos do consumidor? Quanto ao 'consumo adequado', consiste em aplicações semanais de vitórias sobre os adversários; o produto deve ser usado seguindo uma rotina de pequenas conquistas, saboreando aos poucos, rodada a rodada, os títulos que no final certamente virão. Prazos de validade: não mais que um ano; o tempo necessário pra vencer mais um capeonato. Ah, o Código fala em 'igualdade nas contratações'. Notaram que o time do São Paulo não tem nenhum supercraque, nenhum jogador que seja, por assim dizer, um 'desigual', numa equipe que, à excessão do espetacular Rogério Ceni, foi marcada pelo 'conjunto'?

IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva (...). Não é difícil encontrar por aí, no mundo do futebol, publicidade enganosa: é projeto Tóquio pra lá e pra cá, título mundial conquistado em território brasileiro em final contra time carioca, parcerias com megainvestidores internacionais, construção de verdadeiros templos do futebol que, dizem os anunciantes, superariam em modernidade e em capacidade qualquer estádio de São Paulo. Conversa! O tricolor, esse sim, tem três mundiais, parceiros de primeira linha e o maior estádio de São Paulo, o Morumbi. O resto é propaganda enganosa, balela pra enganar o consumidor.

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais (...). Tá bem, vá lá. O tricolor deixou escapar a Libertadores, o Paulista, a Copa do Brasil. O consumidor que eventualmente tenha se sentido moralmente atingido pelas piadinhas e gozações dos adversários deve, agora, mesmo, estar se sentindo reparado (e como!) com a consquista do penta brasileiro.

E o Código segue, ao todo, por 118 artigos. O consumidor/torcedor pode ir lá e conferir, parágrafo por parágrafo. O tricolor tá em conformidade, na letra da lei, como se diz no jargão jurídico. Poderia freqüentar as listas do Procon e do Idec como exemplo de fornecedor que cumpre suas obrigações com o cliente. Como uma montadora, que entrega aos seus consumidores um veículo novinho, não muito sofisticado, é verdade - não somos o Barcelona -, mas robusto e bem equipado pra enfrentar ruas e estradas.

Agora, para os que torcem o nariz pra esse produto pentacampeão de qualidade, o mercado tem outras opções. A escolha é livre. Só não reclamem, depois, se o carro enguiçar no meio do caminho.

Alma de saci

Texto postado no blog Caiporas (http://caiporas.com.br/) em homenagem ao colega Pedro Sansão. Pedrinho, como era chamado, era organizador de corridas de aventura em Botucatu, tinha uns 35 anos e morreu em Buzios (RJ), num acidente de carro, quando voltava do Ecomotion, uma das mais importantes provas de corrida aventura do País.

Conheci o Pedrinho Sansão nos idos e hoje distantes anos 1990, no Objetivo. Ele era dois, três anos, mais velho que eu e nossa conversa nunca foi muito além de um "E aí? Tudo bem?"Pra mim, ele era da turma dos caras mais velhos e ponto final. "A turma do cursinho", coisa distante pra molecada do primeiro, segundo colegial. Tempos do diretor Eledir e do professor Carlão, que, poucos anos depois, seria substituído pelo Célio.

O pouco contato que tínhamos desapareceu de uma vez quando ele deixou o Objetivo, lá por 1993 - em 1994, eu também deixei o 'Biju', quando ingressei na faculdade de Direito, em Bauru. Reencontrei o Pedrinho em 2005 anos depois, em 2005, quando ele trouxe o Ecomotion, uma das principais corridas de aventura do País, aqui pra Botucatu.

Continuamos apenas conhecidos, não amigos, mas, desde então, passei a ter, por ele, uma tremenda admiração. Pedrinho estava envolvido até o pescoço com os esportes de aventura, com turismo ecológico, com a Cuesta da Botucatu. Minha admiração, aliás, só aumentou quando soube que ele havia criado uma agência de turismo ecológico, a Guará - e de quem recebia por e-mail, regularmente, os informativos.

Bem localizada, bem decorada, criativa nos pacotes oferecidos, a Guará me parecia um projeto que tinha, mesmo, tudo pra dar certo (embora, diga-se, tenha me oferecido algumas vezes, pecotes, digamos assim, menos ecológicos e mais convencionais, pra peças de teatro, por exemplo - fazer o que? É preciso sobreviver, that´s business...)

O fato é que, embora eu nunca tenha embarcado nos passeios da Guará, a agência sempre me pareceu uma proposta de primeira. O profissionalismo, pelo jeito, teria, finalmente, chegado ao turismo ecológico em Botucatu.

Pedrinho tinha alma de saci. O saci (aquele, mesmo, de gorro e cachimbo) é um bicho típico da região. Pedrinho certamente lutou pra preserva-los e, com certeza, criava, no quintal da Guará, um casalzinho deles. Amava a Cuesta e, em suas trilhas, encontrou um jeito de ganhar a vida. Sua última grande empreitada, a Travessia da Cuesta de Bike, marcada pro final de novembro, fica, agora, órfã. Assim como ficam um pouco órfãos todos os que acreditavam no seu trabalho.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Dia Mundial sem carro - Terceira e última etapa (As bicicletas de Paris)


Falei, nos dois últimos posts, a respeito das dificuldades de se usar a bicicleta como meio de transporte em São Paulo. Na data estabelecida oficialmente como dia mundial sem carro (22 de setembro), fui da rua Arthur de Azevedo até a USP, num percurso de quatro quilômetros. Menos de uma semana depois, arrisquei (literalmente) uma ida ao trabalho, encararando dificuldades como a falta de uma estrutura mínima nas ruas para se pedalar, a poluição, as reclamações dos motoristas e, em certa medida, o preconceito das pessoas. São Paulo é uma cidade feita pra carro, não pra gente.

Pois bem, em alguns países, principalmente na Europa, o uso da bike como meio de transporte é algo comum - isso não é novidade; quem, diferente deste escriba, já esteve por lá deve saber. O que é novidade é que em alguns locais, o aluguel de bicicletas para uso urbano está se tornando um bom negócio, um business. A JCDecaux, uma companhia francesa especializada em mídia externa (mídia externa significa aqueles anúncios que havia nos pontos de ônibus, em SP, antes da Lei Cidade Limpa), está investindo US$ 115 milhões num sistema de aluguel de bikes em Paris, num modelo de negócios parecido com o que já foi adotado pela mesma empresa em Lion, a terceira maior cidade da França.

Segundo uma reportagem do jornal americano Washington Post, esse dinheiro será usado na compra de 20,6 mil bicicletas, construção de 1,5 mil estacionamentos e contratação de 285 funcionários para gerenciar o projeto. Funcionará assim: a pessoa poderá alugar a bicicleta num dos estacionamentos, pedalar o tempo que quiser e, depois, devolve-la. Simples.

A idéia de se criar um sistema que permita às pessoas terem acesso a bibicletas quando quiserem, para, por exemplo, ir ao trabalho ou ao supermercado, e depois devolverem, não é nova. Em Amsterdan, na Holanda, na década de 1960, um grupo de anarquistas já havia criado algo mais ou menos parecido, o White Bike Plan - algo como Plano das Bicicletas Brancas, já que as bikes eram, todas, pintadas de branco. Embora tivesse a melhor das intenções, a proposta - movida pelo espírito ripongo-altruísta predominante na época - não foi prá frente. Aparentemente não passou pela cabeça dos idealizadores que as pessoas simplesmente poderiam não devolver as bicicletas.


Agora, em tempos de capitalismo nada altruísta, a idéia volta à cena, repaginada e com um indisfarçado intuito de se ganhar dinheiro - o que, afinal, não deixa de ser uma boa notícia. Com o dinheiro entrando em cena, é provável que haja, agora sim, uma precocupação com a manutenção e a devolução das bikes.


Para evitar que algum espertinho, ao alugar uma bicicleta, resolva se 'esquecer' de devolve-la, a JCDecaux exige, no ato do aluguel, documento de identidade mais um depósito de US$ 195 - isso em Lion, onde o sistema já foi implantado. Para desestimular os usuários a ficarem por períodos prolongados com as bikes - o que, por sua vez, pode levar a esses 'esquecimentos' deliberados - foi criado um sistema de tarifas progressivas; quem fica mais tempo com a bicicleta paga, proporcionalmente, mais. A primeira hora de aluguel custa US$ 1,30; a segunda, US$ 2,60 - para que fique mais claro, se ficar durante uma hora com a bike, o usuário pagará, ao todo, US$ 3,90. Os interessados também, podem, em vez de pagar pelo aluguel cada vez que usam o sistema, adquirir um pacote anual, por US$ 19, não incluídas tarifas extras caso excedam um determinado tempo de uso.


Em Lion, pouco depois do lançamento, o sistema já contabilizava 20 mil pacotes comercializados - atualmente, são cerca de 60 mil 'assinantes'. Aproximadamente 17 mil aluguéis são realizados todos os dias. O sistema deu tão certo que, quando a prefeitura de Paris resolveu adotar um programa parecido, outra companhia do setor de mídia exterior, a americana Clear Chanel Outdor também se candidatou a oferecer o serviço - sinal de que, aparentemente, o negócio é bom.

Se tudo sair como o planejado Paris deverá se tornar uma cidade mais huumana. Menos poluída, menos barulhenta e menos congestionada.


O colunista especializado em bikes Matt Seaton, do jornal britânico The Guardian (um dos mais respeitados do mundo) descreve a proposta num artigo com algum entusiasmo. Mas, no final, se mostra cético: "Invariavelmente recebidos com grande entusiasmo, esses esquemas sempre 'se demancham' quando são postos em prática. As bicicletas são pesadas e de má qualidade, a manutenção é mal feita e, no final, são vandalizadas ou roubadas. O risco é de que essas políticas 'visionárias' terminem criando gigantescos elefantes brancos. A questão ainda não respondida é se é mesmo verdade que as pessoas ainda não pedalam porque não possuem biciletas." Só daqui a alguns anos se poderá, afinal, dizer se Matt estava certo. O fato é que é, independentemente dos resultados, já há, em outros países uma preocupação - e, mais que isso, há ações - para se adotar as bicicletas como instrumento para a melhoria da qualidade de vida. Que pena que Matt não conhece São Paulo.


Os links para as matérias do Washington Post e do The Guardian a respeito do assunto são:


http://www.washingtonpost.com/wp-dyn/content/article/2007/03/23/AR2007032301753_pf.html


http://www.guardian.co.uk/environment/2007/mar/15/g2.ethicalliving

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Dia mundial sem carro - Segunda etapa (ou Missão Escritório)


Cumprida a primeira fase de meu 'test bike' (saindo da Rua Arthur de Azevedo com destino à USP), resolvo dar um passo (uma pedalada?) mais ambicioso: ir trabalhar de bike.

A idéia já vinha amadurecendo há bastante tempo em minha cabeça, confesso que mais por motivos de ordem prática - traduzindo: proibição de sair de carro em dia de rodízio - do que por outros mais nobres, como respeito ao meio ambiente (o principal motivo, imagino, para a criação do Dia Mundial Sem Carro) ou questões de ordem físico-desportivas.

Pra ficar mais claro, nos dias em que o rodízio me proíbe de andar de carro das 07h às 10h da manhã, tenho duas opções pra percorrer os sete quilômetros que me separam do meu trabalho: (1) me espremer num superlotado e sacolejante ônibus da linha Jd. Helga-Metrô Barra Funda - a capacidade de um ônibus urbano convencional é de 74 passageiros; no Jd Helga, pelas minhas contas, a ocupação deve ser de mais ou menos 130; e (2) insistir em ir de carro, tendo de acordar duas horas mais cedo - umas 04h30 - pra chegar no escritório, no bairro de Pinheiros, antes das 7h. Nessas circunstâncias, por que não tentar um transporte alternativo?

Confesso que, já na primeira vez em que pensei com um mínimo de seriedade nessa hipótese, cheguei rapidamente à conclusão de que exigiria uma logística tão complexa quanto a de se preparar uma equipe para participar do rally Paris-Dakar. Numa prova como essas, a organização - ou, no termo chique em inglês, o staff- tem de garantir que os pilotos terão um equipamento confiável, alimentação adequada e um mínimo de segurança, tanto contra acidentes, nos momentos em que estão acelerando no deserto, quanto contra roubos, durante a noite, quando param suas máquinas em algum vilarejo de nômades no Marrocos ou na Mauritânia.

A preparação pra o meu 'rally urbano', teria de incluir um bom planejamento do ponto de vista das ruas e avenidas a serem percorridas (de preferência as mais tranquilas); lanternas, na dianteira e na traseira da bike - pra ficar bem visível à noite, na volta -; mochila, pra asssegurar que meu 'kit-executivo' (o traje de trabalho: terno, camisa, gravata, sapato e cinto) chegue no escritório seco, limpo e desamassado e, finalmente, corrente e cadeado - a segurança de meu 'veículo' nos locais em que eu estacionar.

Uma vez atingido meu primeiro objetivo, o de chegar no escritório, começaria a segunda fase - que, claro, também teria de ser planejada. Essa etapa consistiria em trocar o visual de ciclista pelo de executivo e em eliminar qualquer comprometedor resíduo de suor resultante da aventura.

Tudo planejado na véspera, a terça-feira de manhã seria, finalmente, o dia de pôr o plano em ação. O, digamos, estacionamento de meu veículo, fica num canto bem escondido - e com forte cheiro de bolor - bem atrás da área destinada aos carros, no segundo subsolo do prédio. Trata-se de uma enorme barra enorme de ferro na qual há, soldados, ganchos nos quais as bikes ficam penduradas. Contrastando com minha, sem modéstia, moderna bicicleta, as demais são indícios do sedentarismo de meus vizinhos: modelos antigos, muita poeira cobrindo bancos e quadros, cadeados enferrujados prendendo as velhas correntes. Desengancho minha guerreira e saio pela calçada de uma movimentada avenida.

Descubro, mal saindo da garagem, que minha equipe de apoio - no caso, eu mesmo - falhou num detalhe crucial: a previsão meteorológica. Não me passou pela cabeça verificar pela Internet como estaria o clima. O dia está frio e nublado. Uma fina garôa que não combina nem um pouco com a imagem que as pessoas fazem dos passeios de bibicleta cai sobre a cidade, com pequenas pausas para rajadas de vento. Preparado que estou não desanimo. Sigo em frente.


A exemplo do que havia feito no sábado anterior, vou disputando o espaço com os pedestres na calçada para não correr o risco de ser atropelado pelos carros, na rua. Em menos de um quilômetro, alcanço a avenida Sumaré, com seu enorme canteiro central no qual as pessoas costumam fazer caminhadas e correr todos os dias e o dia todo. Nas laterais, na faixa mais à esquerda, há vias especiais para as motos seguirem em segurança, sem passar no meio dos carros, como ocorre nas outras avenidas. Alguns ciclistas se arriscam a disputar esse espaço com os motociclistas. Eu não. Fico, mais uma vez, na calçada.

Disputando espaço quase sempre com os pedestres e, menos frequentemente, com os carros, chego à entrada do prédio em que trabalho em 30 minutos. De carro, num dia normal de trânsito forte, a ida ao escritório tomaria 40 minutos, mais ou menos. No item 'tempo', portanto, a operação foi bem sucedida. Mas agora vem a parte mais difícil: entrar vestido de ciclista e encontrar um lugar para mudar de roupa. Tudo isso, de preferência sem ter de subir pelo elevador até o 17º andar, onde trabalho - isso provavelmente implicaria dar de cara com algum colega e consequentemente ser alvo de chacotas. (Posso estar enganado, mas não acredito que as pessoas compreenderão a maluquice de encarar o trânsito de SP a bordo de uma bike pra ir pro trabalho. Sendo assim, melhor evitar exposições públicas.)

Descubro, no fundo da garagem (sempre o fundo da garagem), um banheiro usado pelos funcionários. Um cúbiculo mofado, no fundo do qual se esconde um vaso sanitário fedorento e uma pia de louça branca, toda suja de graxa. Espremido, retiro o conteúdo da mochila-tudo incrivelmente seco e desamassado! -, me equilibrando num pedaço de papelão pra não sujar os pés no chão molhado. O terno, a camisa e a gravata ficam dentro da pia, protegidos precariamente por um saco plástico de supermercado antes usado para embalar os sapatos. Trocado, ponho de volta na mochila o 'kit ciclista'. Como o prédio não dispõe de um estacionamento específico, por mais simples que seja, acorrento minha bicicleta no corrimão de uma escada, num canto do primeiro subsolo.


Usando um terno preto, camisa branca e uma gravata azul, bem sóbria, saio do banheiro transformado. Outro homem. Entro no elevador cumprimento os colegas pensando, já, no momento da saída, às 18h, quando terei de encarar mais uma sessão de banheiro fedorento e trânsito pesado. Sem dúvida, São Paulo é uma cidade feita para carros, não para pedestres. Muito menos para bicicletas.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

The paths of Kruger Park

Peço licença aos meus dois leitores e meio em português pra postar, a pedido dos meus outros dois leitores, os não brasileiros, um texto em inglês. Trata-se de uma tradução do texto anterior, 'As veredas do Kruger Park'. Meus agradecimentos à colega Thais e seu digníssimo, Diogo, que verteram o material do vernáculo pátrio para o anglófono.


As João Guimarães Rosa, a Brazilian writer, once wrote, sertão is as large as the world. It goes as far as your eyes can see. During these days of drought, sertão is like an enormous ocean of dark colors, such as yellow, brown, grey, and, sometimes, green. Kruger Park, the biggest national park in South Africa is like a huge sertão. An endless plain land, made of small, dry, twisted trees, spreads across dozens of kilometers all the way to the horizon, where all these dark colors meet the blue of the sky.

Created in 1989, by former president of the Transvaal Republic (nowadays, part of South Africa), Paul Kruger, the park functioned, in its early years, as a reserve intended to protect wildlife. By that time, no tourist visit was allowed. It was only in 1926, when it was officially turned into a national park, that Kruger Park started to receive visitors. Hundreds, thousands, millions of them.

Since that, the park has grown and continues on growing as one of the most important destinations for adventurers from all over the world who search for wild animals - and, at the same time, as a land were these animals are, in fact, wild. In Kruger Park, life follows its natural course with both big and small battles to survive.

The park numbers are impressive. Its total area is up to 2 million hectares - equivalent, for example, to Israel. It received, in 2006, 1.2 million tourists, close to a fifth of all visitors who come to Brazil during one whole year. There are 12.5 thousand elephants, 7 thousand rhino, 7 thousand giraffes, 21 thousand zebras and 120 thousand impalas (a kind of antelope) according to the last cense, which took place in 2005.

We traveled across Kruger Park in a three day safari from the main entrance, the Paul Kruger Gate. We could see, live, almost all these species. Out of the called 'big five', the quintet of large mammals that fulfill the dreams of safari operators (bull, lion, rhino, elephant and leopard), we just were not able to see the leopard, a wild cat related to the Brazilian jaguar. That maybe due to its reserved personality, less inclined to public apparitions. Personality that is, actually, the opposite of another related wild cat, the lion, which shows no embarrassment and with an enormous dose of vanity, parades among the cars of marveled tourists and the thousand clicks from digital cameras (see the picture). This is also an identifiable personality characteristic of many leo, such as this writer.

But differently of what you can imagine by the numbers, travel across this sertão’s dusty roads looking for animals is quite a patience exercise. Men, here, are just spectators. The animals, the land owners, are there, but not to be watched, like in a zoo. Predators and preys carry out, daily, their roles, minding no men. That is why you need to learn to delight yourself with the small clues that theses daily battles leave throughout the burned soil of the African savannah.
The carcass of an antelope devoured by a lion, for example, left by the side of the road (see the picture); the scratches, on a tree trunk, made by the nails of a leopard which sharpened its claws there, like a huge cat; the rhino’s excrements splattered on the floor in a way to show the other rhinos that he is the owner of the area; the huge and round footprints of an elephant. Sertão is not obvious. Nature is not obvious.

sábado, 22 de setembro de 2007

Dia Mundial sem carro - Primeira Etapa

Peço desculpas aos meus quase dois leitores pelo longo período de ausência. Escrever demanda tempo, paciência e uma considerável dose de vontade de compartilhar com as pessoas sentimentos, idéias e experiências. Idéias, experiências e principalmente sentimentos - de amor e de ódio - nunca me faltaram. Tempo e paciência, esses, sim, andaram em falta.

Mas, passado esse período cinzento - outros ainda virão, entendam...-, tô de volta. Pra falar sobre o tal 'Dia Mundial sem Carro'. Só pra situar, essa efeméride foi criada nos anos 1970 na Europa, durante a crise do petróleo. Na década de 90, os dias sem carro ('carfree days', em inglês) se tornaram mais e mais populares. Surgiram ONGs especializadas em tratar da questão e, em 1999, foi estabelecido o Dia Internacional sem Carro - quem quiser saber mais dessa história, o site é http://www.worldcarfree.net/ .

No Brasil, o carfree day foi realizado pela primeira vez em 2001. Atualmente, é adotado em mais de 100 municípios, com destaque, claro, para as capitais, onde o trânsito é um dos maiores problemas.

Os números mais recentes da Fundação Seade dão conta de que, em 2002, havia na cidade de São Paulo 5,5 milhões de veículos - o equivalente a 24% de toda a frota nacional. Considerando-se que o crescimento de 3% ao ano no período de 1998 a 2002 se manteve nos anos seguintes, o número de carros na cidade seria de mais ou menos 5,7 milhões. A malha viária, pelo que informa o site da Prefeitura, é de 15,5 mil quilômetros e, até onde sabemos, não tem recebido grandes investimentos em amplição. O próprio prefeito Gilberto Kassab declarou que há um déficit de 110 quilômetros de vias. Temos, enfim, cada vez mais carros numa estrutura de ruas e avenidas que praticamente não cresce. O resultado todo mundo conhece.

Foi justamente por causa desse enorme caos em que se transformou o trânsito de São Paulo que o Dia Mundial sem Carro chamou tanto a atenção. Nos rádios, TVs e jornais, o assunto ganhou visibilidade. A questão é: a população adotou pra valer essa idéia? Pra conferir se isso, de fato, ocorreu e pra dar minha parcela de contribuição, resolvi fazer um 'test-bike', em duas etapas.

Sábado, 22 de setembro, o dia mundial sem carro. Primeira etapa. Trajeto de quatro quilômetros.

Primeira constatação: o dia mundial sem carro não foi, assim, sem carro. Partindo da rua Arthur de Azevedo, em Pinheiros, viro à esquerda na rua Pedroso de Moraes, onde, puxando pela memória, me lembro de que havia uma bicicletaria - uma portinha acanhada e cuja sujeira escura produzida pela borracha dos pneus e pela graxa mais fazia lembrar uma borracharia, mas mais que suficiente para calibrar meus pneus. "Dia mundial sem carro? O senhor tá brincando. Pra falar a verdade, o movimento hoje tá igual ao dos outros sábados. O pessoal, pelo jeito, não se empolgou muito com a idéia de trocar o carro pela bicicleta", me informa o simpático dono da loja.

Seguindo em frente, ainda pela Pedroso, vou em direção à avenida Rebouças, uma das mais importantes de São Paulo. O movimento me confirma a informação do vendedor. O número de carros me parece igual ao de outros sábados - coisa que, aliás, os jornais também constatariam; a manchete da Folha de S. Paulo, por exemplo, no dia seguinte, era: "Trânsito e poluição marcam o Dia Mundial Sem Carro em SP".

No semáforo da Pedroso que dá para a Rebouças, sigo, como as motos, pela trilha que se abre no meio das filas de carros que esperam pelo sinal verde. Num Honda Fit prateado, uma garota de óculos escuros me olha feio através dos vidros fechados. Vira o rosto. Uma mulher de cabelos cacheados ao lado, ao volante - provavelmente a mãe -, buzina, preocupada com o perigo de que eu risque seu veículo. O sinal abre. Sigo, ainda no meio dos carros.

Busco um pouco de segurança pedalando o mais próximo possível do meio fio, como recomendam os especialistas em 'ciclismo urbano'. Mas um, dois, três ônibus enormes passam muito próximos de mim, quase me derrubando. Os carros, menores, preferem buzinar, da mesma forma que a tia do Honda Fit havia feito minutos antes. Me lembro instantaneamente do que a Renata Falzoni - fundadora do grupo Nightbikers e maior especialista no assunto - havia dito em entrevista na Rádio CBN um dia antes: "Se você quer começar a pedalar no trânsito de São Paulo, esqueça as regras e vá pela calçada, respeitando os pedestres. Não é o mais correto, mas é o mais seguro". Constatação, aliás, que eu já havia tido três ou quatro anos atrás, quando, quando fazia diariamente o percurso entre meu apartamento, na Barra Funda, e o Estadão, onde trabalhava. Não dá pra esperar, mesmo, o respeito dos ônibus e, principalmente, dos carros. Sendo assim, decido deixar de correr riscos, andando pela rua, para causar riscos, pedalando pela calçada.

Dois quarteirões antes de onde a Rebouças se transforma na ponte Eusébio Matoso (que, por sua vez, dá para a avenida Francisco Morato), começo a ter uma noção mais clara do sacrifício diário a que os pedestres - com quem agora divido a uma estreita feixa entre a avenida e as garagens das casas - são submetidos todos os dias naquela região. A calçada, toda esburacada, exige habilidade pra escapar de pedaços de piso soltos, buracos e pequenas poças formada pela água usada para lavar a fachada das casas e postos de gasolina na região. Já as guias rebaixadas para deficientes estão em todas as esquinas. Só que, em muitos casos, nessas mesmas esquinas em que há as guias rebaixadas, não há um semáforo ou uma faixa que seja para permitir que o pedestre - ou, nesse caso, o ciclista - atravesse a rua em segurança.

Na ponte Eusébio Matoso, descubro que há, quase invisível aos olhos preocupados com o trânsito dos motoristas, uma área para a passagem de pedestres - estreita, acanhada, mas ali está, pra facilitar minha vida. Ainda na ponte, uma pausa para observar com um pouco mais de atenção o caldo escuro e fedorento (muito fedorento!) do Rio Pinheiros, coisa impossível de se fazer a bordo de um automóvel. Cruzo com pedestres e alguns ciclistas. Nada de cumprimentos. Apenas olhares de cumplicidade - o mesmo tipo de olhar de cumplicidade que trocam os vestibulandos, os maratonistas e os passageiros das companhias aéreas, nas intermináveis filas dos guichês e salas de embarque.

No final da ponte, outro obstáculo: os tubos de aço que servem como base de apoio para as enormes placas de sinalização - em geral, essas placas têm um metro e meio de comprimento por dois de largura - são instalados nas calçadas, dificultando a passagem de pedestres. Sigo por mais cinco quadras, pela avenida Valdemar Ferreira até o portão principal da USP. Estou a salvo. No dia sem carro, como em todos os outros, o trânsito de SP esteve um caos. Por causa dos carros.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

As veredas do Kruger Park

Como disse João Guimarães Rosa, o sertão é do tamanho do mundo. Do tamanho de até onde a vista alcança. Nesses meses de seca, o sertão é como um imenso mar de tons amarelos, marrons, acinzentados, negros e, às vezes, verdes. O Kruger Park, maior parque nacional da África do Sul, na savana africana é assim, como um imenso sertão. Uma planicie interminável composta por árvores baixas, secas e retorcidas, que se espalha por dezenas de quilômetros até o horizonte, onde todos esses tons escuros se encontram com o azul do céu.


Criado em 1989, pelo então presidente da República do Transvaal (hoje parte da África do Sul), Paul Kruger, o parque funcionou, nos primeiros anos, como uma reserva destinada à proteção da vida selvagem, sendo proibida a visita de turistas. Foi somente em 1926, quando foi transformado oficialmente em parque, que o Kruger passou a receber visitantes. Centenas, milhares, milhões.

Cresceu em tamanho e segue sendo um dos principais destinos de aventureiros de todo o mundo em busca de contato com os animais selvagens - e, ao mesmo tempo, como uma área em que esses animais têm a liberdade de ser, de fato, selvagens. No Kruger Park, a vida segue seu curso de pequenas e grandes batalhas pela sobrevivência.


Os números do parque são impressionantes. A área total é de 2,0 milhões de hectares - o equivalente, por exemplo, ao Estado de Sergipe ou a Israel. Recebeu, em 2006, 1,2 milhão de turistas, mais ou menos um quinto do número de visitantes que o Brasil recebe anualmente. Possui 12,5 mil elefantes, 7 mil rinocerontes, 7 mil girafas, 21 mil zebras, 30 mil búfalos e 120 mil impalas (uma espécie de antílope), segundo o último censo, realizado em 2005.


Percorremos o Kruger Park num safari de três dias, a partir da entrada principal, a Paul Kruger Gate. Pudemos ver, ao vivo, quase todas essas espécies. Dos chamados big-five, o quinteto de grandes mamíferos que faz a alegria das operadoras de safaris (búfalo, leão, rinoceronte, elefante e leopardo), só faltou, mesmo, o leopardo, o 'irmão' da nossa onça pintada. Reflexo, talvez, de sua personalidade reservada, menos dada a grandes aparições em público. Personalidade, aliás, oposta à do primo leão, que, sem o menor pudor e com enorme dose de vaidade, desfila por entre os carros dos turistas extasiados e os milhares de cliques das câmeras digitais (foto), características, por sinal, identificável na personalidade de boa parte dos leoninos, como este escrevinhador.

Mas, diferentemente do que se pode imaginar pelos números, percorrer as estradas de terra empoeiradas desse sertão em busca da bicharada é um exercício de paciência. O homem, aqui, é apenas expectador. Os animais, donos do pedaço, estão alí, mas não para serem vistos, como num zoológico. Predadores e presas cumprem, diariamente, seus papéis, sem se importar com o bicho homem. Por isso, é preciso aprender a se encantar com as pequenas pistas que as batalhas do dia-dia vão deixando pelo chão queimado do cerrado africano.

A carcaça de um antílope devorado pelo leão, por exemplo, deixada à beira da estrada (foto); as marcas, no tronco de uma árvore, das unhas de um leopardo que alí afiou suas garras, como um gato enorme; o cocô de um rinoceronte, espalhado pelo chão como forma de demonstrar aos demais de sua espécie que é dono daquele território; as pegadas enormes e redondas de um elefante. O sertão não é óbvio. A natureza não é óbvia.

Mais infomações

Site oficial do Kuger Park
http://www.sanparks.org/webcams/satara.php

Bundu Safari
http://www.bundusafaris.com/